RESPOSTA AO BISPO DE NATAL, DOM JOÃO DOS SANTOS CARDOSO ,

RESPOSTA AO BISPO DE NATAL, DOM JOÃO DOS SANTOS CARDOSO 


agosto 20, 2025


​Querido Dom João dos Santos Cardoso, Bispo de Natal,


​Li sua missiva em apoio a Clodovis Boff e a sua crítica à chamada “indução do cristianismo para uma perspectiva sociológica”. 


A vossa excelência afirma que a Teologia da Libertação teria "deslocado o centro da Igreja de Cristo para a sociologia, produzindo esvaziamento espiritual”. 


No entanto, acredito que o senhor, ao defender tal posição, incorre na mesma contradição que critica.


​O senhor defende a necessidade de uma fé viva, mística e missionária, com a primazia de Jesus Cristo como "coração pulsante" da Igreja. 


Eu concordo plenamente. O que discordo, e é a essência do meu argumento, é que essa visão teórica se anula na prática, especialmente quando se defende um conservadorismo que asfixia o Evangelho.


O que vivenciamos entre as décadas de 1960 e 1980 foi uma verdadeira “primavera católica”. O Concílio Vaticano II abriu janelas e o sopro do Espírito Santo, mediado pela Teologia da Libertação, fez a Igreja florescer. 


Foi um tempo em que os jovens não eram números frios de estatística, mas protagonistas da fé, que se organizavam em grandes grupos, viviam em comunhão e partilhavam a vida. 


Eles se apaixonaram pela Igreja porque a viam caminhando junto ao povo, gerando consciência crítica e fortalecendo sua dimensão comunitária e missionária.


​Nessa época, a formação nos seminários produziu padres comprometidos com o Evangelho e com as lutas populares, que atuavam nas favelas, nos cortiços e na defesa dos direitos humanos. 


Os milagres que aqui se produziam não eram fruto de alienação religiosa, mas da encarnação de uma fé que, como o senhor diz, une de forma inseparável o serviço ao mundo e o anúncio da salvação.


​No entanto, a partir do papado de João Paulo II, essa primavera foi substituída por um “inverno católico”. 


O que veio em seu lugar foi um endurecimento conservador que perseguiu teólogos e comunidades, desmantelou experiências libertadoras e congelou dioceses em uma lógica hierárquica e no medo da renovação. 


A formação clerical se tornou rígida, moldando padres que se preocupam mais com o modelo do carro da paróquia e com a sua própria imagem do que com a fome dos que estão em suas portas.


​Este é o clericalismo que vossa excelência e outras excelências que pensam como o senhor e Clodovis Boff parecem ignorar, e que é o verdadeiro câncer que maltrata e machuca tanto a Igreja. 


Ele - o clericalismo - transforma a função sacerdotal, que deveria ser de serviço, em uma fonte de poder que cega e aliena tanto o sacerdote quanto a própria comunidade!! E os que não suportam, são convidados a se retirar da Igreja. Às vezes de forma implícita, mas comumente, é dado um convite de saida. 


O senhor sabe - e converso com muitos bispos que confirmam - que essa lógica, torna o bispo refém de grupos de sacerdotes que boicotam o verdadeiro trabalho pastoral, usando o argumento de que "não querem fazer política na igreja," mas na verdade se engajam na forma mais covarde de política, que é a de fechar os olhos para as injustiças.


​O que está em jogo, Dom João, não é um debate teórico sobre sociologia. É a fidelidade ao Evangelho. Uma fé que não gera compromisso com os pobres não é fé cristã, é ideologia. 


O fascismo religioso e o bolsonarismo que se manifestam em setores da Igreja, tanto católica quanto evangélica, são a prova de que quem realmente tem produzido ideologia na Igreja são aqueles que dizem ser contra ela.


​A Igreja que Jesus propõe é aquela que tem lado, que não é isenta. É uma Igreja que se posiciona claramente ao lado dos pobres, promove a inclusão das mulheres — que floresceu nas bases das CEBs, e não nas sacristias do poder — e clama por reparação histórica, especialmente pela dívida que a Igreja tem com a escravidão.


​Se a fé não toca o chão da vida, ela é palavra vazia. Se a Igreja não se compromete com os pobres, trai a Cristo. Se os pastores não denunciam as injustiças, tornam-se cúmplices delas.


​Prefiro, sinceramente,  errar estando ao lado dos pobres e ser confundido com um agente meramente político, que vocês chamam de comunistas, do que me submeter aos ditames de uma Igreja que não se compromete com o evangelho que diz defender. Ficarei com a Igreja Católica Apostólica Romana!! Aquela que Dom Hélder, dom Luciano Almeida, Dom Paulo Evaristo Arns, de Papa João Paulo VI João XXIII e Francisco 




​Com todo o respeito,


​Toninho Kalunga, leigo católico, membro da Fraternidade Leiga Charles de Foucald e participante da paróquia Santo Antônio da Granja Viana na comunidade São Luis Orione o Pequeno Cotolengo Paulista.

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