Publicação de uma carta de Frei Betto a respeito do que publicou a míope revista Veja!
Frei Betto
Veja o leitor, há uma revista semanal que odeia pobres e quem a eles se dedica. Revista que ignora as regras básicas do bom jornalismo e nem se preocupa em bem informar o leitor. Todas as suas matérias são editorializadas, de tal modo que até mesmo uma entrevista é publicada, não segundo palavras do entrevistado, mas de acordo com a conveniência do veículo entrevistador. Semanas atrás, no encarte contido na edição destinada a São Paulo, a revista desancou uma das pessoas mais íntegras que conheci em toda a minha vida: o padre Júlio Lancellotti. Um dos raros santos vivos de quem tenho a graça de ser amigo. Júlio se dedica, há anos, ao povo da rua da capital paulista: pedintes, doentes mentais, desempregados, catadores de papel etc. A todos serve com espírito evangélico. Quando sofrem violência por parte da polícia, é Júlio o anjo que lhes dá proteção. E abre as portas de sua igreja para que ali se sintam em casa. Júlio faz o mesmo com a crianças de rua e os internos da Febem. E não age como quem se interessa em “catequizá-los”. Sabe muito bem, graças à sua boa formação teológica, que essa gente excluída expressa de modo especial a face viva de Jesus, que com eles se identificou (Mateus 25, 31-44). Quer apenas que se sintam pessoas dotadas de dignidade e direitos, ainda que a nossa sociedade, fundada na desigualdade econômica, os tenha escorraçado para as calçadas da mendicância e os becos do desamparo. Veja, leitor, a revista semanal, do alto de seu empertigado farisaísmo, identificou na atitude de vida do padre Lancellotti pura demagogia, levantando indagações que fazem eco às cobranças dos fariseus a Jesus. Por que o padre Júlio não vai morar debaixo da ponte? Por que não abre a igreja para servir de moradia ao povo da rua? O que revela desinformação a respeito dessa parcela sofrida da população. Só o preconceito e a ignorância explicam a miopia de certas pessoas que confundem morador de rua com bandido e julgam que ele vive ao relento por não ter um teto que o abrigue. Há exceções, mas a maioria faz da rua uma opção de vida. Ali há liberdade, o descompromisso, o fim de opressões outrora sofridas no trabalho e na família (espancamentos, abusos sexuais, alcoolismo etc). E são raros os que mendigam. Preferem viver do próprio trabalho, como catar lixo reciclável. Quem levaria para casa uma criança nascida com Aids e abandonada pela família? Padre Júlio já levou centenas. A revista não viu as duas unidades da Casa Vida em São Paulo, que visito com freqüência. Ali as crianças recebem cuidados médicos e terapêuticos; são educadas no asseio e escolarizadas; aprendem a ter auto-estima e ser felizes. Cega, a publicação semanal não quis ver nada disso. Nem mesmo este detalhe: cerca de 90 crianças, mesmo virtualmente condenadas à morte por uma enfermidade incurável, já foram adotadas por famílias européias. A revista que se gaba de ver não viu que há milagres no mundo: casais que, impossibilitados de procriar, escolhem adotar uma criança filha da miséria e contaminada pelo vírus HIV. Graças à evangélica dedicação do padre Júlio Lancellotti, cujo testemunho enobrece a espécie humana.
Frei Betto é escritor, autor de “A menina e o elefante” (Mercuryo Jovem), entre outros livros.
A TEORIA SEM PRÁTICA É IGUAL A FÉ SEM OBRAS: VAZIA E MENTIROSA...
Não me sinto digno o suficente para se quer defender Pe. Julio Lancelotti. Sua prática é maior que qualquer palavra. Como ser humano, passível de erros, como homem de fé, a certeza de ser um exemplo a ser seguido.
Se a intimidade de todos os jornalistas da VEJA fossem escancaradas e exploradas da forma nojenta que os torquemadas desta medíocre mídia faz quem sabe este debate sequer existiria.
De todo modo. Que fique a pratica, pois o coração é terra que homem/mulher nenhum põe os pés. http://www.casavida.org.br/
Viva Padre Julio Lancelotti. Viva a sua bela obra!!
2 comentários :
Está na cara, Toninho, que esta é mais uma investida para enfraquecer a luta daqueles que vivem e trabalham pela justiça social. Gente (com G maiúsculo) como é o padre Júlio Lancellotti é sempre uma pedra no sapato daqueles que descansam no berço esplêndido da mentira e da exploração dos mais fracos.
É isso... a voz do profeta sempre incomoda os poderosos!!
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